Consultor Jurídico: a intransigência com a liberdade jornalística responsável

Publicado no Consultor Jurídico

A vida é um sopro, já diria Oscar Niemeyer. Faz 25 anos que sou leitor assíduo deste periódico online Consultor Jurídico (ConJur). Parte desse tempo como estudante e, depois, o tempo maior, como profissional do direito. Tive a honra de escrever uma coluna quinzenal no ConJur sobre Liberdade de Imprensa. Desde 1997, data que lembro ser seu nascimento, o veículo cresceu, encorpou e passou a ser uma fonte de consulta de toda a comunidade jurídica, fruto de equipes talentosas que se sucederam ao longo do tempo.

Incansável na defesa da liberdade de imprensa, o ConJur pôde registrar por meio de sua história e de seu texto — e o fez de modo irretocável — a efetiva mudança que o país enfrentou em relação a tal matéria.

Se, antes da CF 88, a imprensa sofria com demandas penais, após a promulgação da Carta Magna brasileira, viu-se uma enormidade de ações indenizatórias, especialmente contra o noticiário político publicado pela imprensa.

Os princípios democráticos que nortearam os novos ares da República brasileira fizeram com que a informação e toda sorte de noticiário jornalístico fossem firmemente protegidos pela Constituição de 1988, mas faltava, ainda, que a Corte Suprema, provocada pelo novel instrumento processual de controle de constitucionalidade, a ADPF, empreendesse hermenêutica a respeito da proteção da atividade jornalística frente aos direitos da personalidade, invariavelmente tensionados.

Ao julgar a ADPF 130, proposta pelo PDT, para que fosse, em síntese, declarada a não recepção da Lei de Imprensa de 1967 — editada no regime em que o coturno, a perseguição, o cala-boca e a força imperavam —  o STF, por maioria, declarou o valor da informação jornalística como um sobredireito, impedindo qualquer forma de censura, bem como orientou que, havendo condenação por excessos praticados pela atividade de imprensa, as indenizações fossem arbitradas modicamente, a fim de que não configurassem intimidações e, assim, comprometessem o relevante papel da imprensa na construção democrática brasileira.

A decisão do Supremo não estava a significar salvo-conduto para as diatribes cometidas pelos jornalistas — e são muitas —, mas assegurava à sociedade brasileira, tal como acontece em toda nação verdadeiramente democrática, a garantia de uma imprensa livre, sem peias ou perseguições, respondendo por seus abusos, na esperança de que, com isso, tivéssemos a criação do cidadão bem educado democraticamente, isto é, formado no respeito aos princípios democráticos, como ensina o professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho [A democracia possível, p. 52].

E, nesse estado de coisa, o ConJur teve participação importante. Intransigente com o valor democrático da liberdade de imprensa, realizou inúmeras matérias a respeito das arbitrariedades jurídicas cometidas pelos poderes públicos. Com textos profundos e técnicos, revelou acertos e erros cometidos pelo Judiciário, sempre dando a oportunidade de fala a todos os envolvidos na cena jornalística.

Crítico sobre as divergências entre o que decidiu o STF, na ADPF 130, e o que os Tribunais regionais julgavam, posicionou-se contrariamente às decisões motivadas pelo iluminismo individual de alguns julgadores, sem observância ao que dispõe a lei e sem o devido respeito às súmulas e jurisprudência dominante, como impõe o atual Código de Processo Civil. Sem corporativismos, dedicou espaço para a discussão dos abusos da imprensa e revelou, igualmente, os erros dos colegas jornalistas. Em razão da agudeza de textos e revelações, por vezes pagou o preço pelo exercício do ofício — mas, fica aqui o registro, como advogado do veículo, as vitórias foram infinitamente maiores.

Em uma época que jornalismo passou a ser quase que torcida de futebol, polarizado como ideologias, confundido com a expressão manifestada por indivíduos em páginas virtuais, propositadamente manipuladas para ganharem ares de imprensa, o ConJur, nos seus 25 anos, é ainda a esperança da informação bem apurada, da fonte de consulta de notícias e de artigos bem construídos, da crítica ácida elaborada na dose certa.

Nesse quarto de século de atividade profissional, o ConJur bem representa a ideia de retroalimentação e dependência mútua da imprensa com a democracia [ministro Ayres Brito, ADPF 130], eis que inexiste uma sem outra.

Parabéns, Consultor Jurídico (ConJur). Parabéns a toda a sua atual equipe e aos profissionais que por aí passaram. Vida longa ao ConJur!

Alexandre Fidalgo é doutor em Direito pela USP, mestre em Direito pela PUC-SP, advogado e sócio do escritório Fidalgo Advogados. Integrante do conselho jurídico da Fiesp e do conselho de liberdade de expressão da OAB Federal.

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